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Donald Trump adora posar de defensor global da liberdade de expressão. Prova disso é a recente queda de braço com autoridades brasileiras, em especial ministros do Supremo Tribunal Federal (STF), a quem Trump e seus aliados acusam de censurar empresas e cidadãos americanos nas redes sociais. Mas por trás dessa retórica inflamada, há um enorme paradoxo: o mesmo Trump que grita contra a “censura” no Brasil é o líder que, dentro dos Estados Unidos, ou anos tentando amordaçar a imprensa crítica e sufocar qualquer voz que ousasse questionar seu governo.
O pano de fundo no Brasil não é o que Trump quer fazer parecer. Embora o país já tenha o Marco Civil da Internet — aprovado há anos como uma espécie de constituição da internet, definindo direitos, deveres e princípios para o ambiente digital —, o STF atualmente analisa a necessidade de regulamentação mais específica para as redes sociais. O argumento central é que faltam regras rígidas que obriguem as plataformas digitais a combater de forma eficaz a disseminação de desinformação, discurso de ódio, ameaças à democracia e campanhas de notícias falsas. Ou seja, longe de ser um movimento de censura, trata-se de uma tentativa de proteger o espaço público democrático das garras da mentira industrializada no "país das liberdades".

Trump, por outro lado, está travando uma guerra narrativa. Ao acusar o STF brasileiro de sufocar a liberdade, ele tenta vestir a capa do defensor das empresas americanas como X (antigo Twitter), Google e Meta. Mas os registros de seu próprio governo desmentem essa fachada.
Não faltam exemplos. Trump retirou credenciais de jornalistas que o confrontavam, como no caso do repórter Jim Acosta, da CNN, banido da Casa Branca após uma pergunta incômoda em 2018 e uma desculpa pífia para a medida. Chamou consistentemente a imprensa de “inimiga do povo”, inflamando apoiadores contra repórteres que cobriam suas coletivas e eventos. Incentivou processos judiciais, assédio público e campanhas digitais para descredibilizar veículos como The New York Times, Washington Post e CNN. Tudo isso não como defesa da verdade, mas como estratégia para minar a crítica e fortalecer uma narrativa única: a dele próprio.
Quando Trump tenta pressionar o Brasil, ele não está interessado em proteger a liberdade dos brasileiros ou mesmo das empresas americanas. Está interessado em criar um palanque político, surfando no discurso de que é um herói da liberdade global, mesmo enquanto dá golpes diretos nos pilares democráticos dentro de casa.
Enquanto isso, as autoridades brasileiras, lideradas pelo STF, enfrentam um desafio complexo: garantir que as redes sociais não se tornem canais livres para destruir reputações, disseminar ódio e fomentar ataques às instituições democráticas. Isso não significa calar opiniões legítimas — significa estabelecer regras para conter abusos que já mostraram ter consequências devastadoras, como os ataques golpistas de 8 de janeiro de 2023 em Brasília.
É importante lembrar que, até aqui, o Brasil não se intimidou com a retórica vinda de Washington. Há um entendimento crescente de que plataformas digitais não podem mais operar sob a lógica de que são apenas intermediárias neutras. Sem regras claras, a balança pesa a favor de quem espalha desinformação em escala industrial — e isso tem preço alto para qualquer democracia.
O que fica evidente nesse embate é a hipocrisia de Trump: o homem que, em nome da liberdade, quer proteger o caos digital lá fora, enquanto tenta silenciar jornalistas dentro de casa. Ele acusa censura onde há tentativa de regulação democrática, mas pratica intimidação onde deveria haver liberdade plena de imprensa.
O caso brasileiro, longe de ser um ataque à liberdade, é um alerta global: estamos entrando numa era em que as democracias precisam urgentemente de novas ferramentas para lidar com o poder das redes, sem abrir mão dos princípios que as sustentam. Quem grita “liberdade” apenas quando convém, como Trump, não está defendendo um ideal — está apenas jogando para sua plateia. E nisso, todos as democracias no mundo perdem.
Fonte: Portal A10+